Fui fazer um show no litoral paulista
Um ginásio lotado, muita gente na pista
A entrada era franca, hip hop era o tema
Tinha break, grafitti, batalha e zero problema
Jovem, velho, criança, todo mundo na paz
Muita gente na quadra e chegava cada vez mais
Quem chegava dançava, quem não dançava cantava
E quem cansava sentava na arquibancada lá atrás
Bem aqui na minha frente a energia era imensa
O meu filho e uns amigos também marcaram presença
Reparando em cada um ali curtindo o momento
Vi um jovem sentado em cima do equipamento
Bem na caixa de som, colado no guitarrista
Cabeludo, tranquilão com um visual de skatista
Mas o show foi rolando em sintonia com a massa
Eu me amarro em fazer show quando o ingresso é de graça
Solitário surfista mas não tava sozinho
Umas minas lá no meio improvisaram um passinho
Convidei lá pro palco, por favor, segurança
Abre a grade e libera essa galera da dança
Invasão consentida, eu sentindo a batida
Fazendo a rima e pensando na vida, só gratidão
No final dessa música os fãs voltaram pra pista
E o cabeludo ali da frente me chamava com mão
Eu me abaixei pra entender o recado
E só então eu entendi porque ele tava o
Tempo todo sentado com seu skate do lado
Em cima do alto-falante
Ele pediu pra eu mandar uma letra pros cadeirantes
Me pegou de supresa, mas gostei da ideia
Repeti no microfone e dividi com a plateia
Dediquei a ele uns versos da letra de Sem parar
Perguntei o seu nome e ficou fácil lembrar
O nome dele era Vítor e eu já disse na hora
Cê tá ligado que o seu nome tá chamando a vitória?
Isso ficou na memória, e eu aqui nesse instante
Ainda lembro do Vítor e do seu olhos brilhantes
Boa sorte
Firme e forte
Vai com a força da mente
Firme e forte
Vai com a força da mente
E essa aqui eu dedico a todos os cadeirantes
Que tem a alma gigante e o coração mais ainda
Perseverança e vontade de quem na dificuldade
Encontra forças pra escrever as histórias mais lindas
É, vocês me inspiram tipo o Mick do Skate
Meu irmão da Rocinha que o morro inteiro respeita
E quando eu era criança eu nem sabia quem era
Eu só olhava e pensava “que isso, o cara é mó fera”
E até hoje a galera para pra ver ele passar
Descendo a curva do S, ele parece voar
Lá vai o Mick do skate, ele é o pai do Maiquinho
Criou seu próprio caminho
Por entre as motos e ônibus
E o Vítor também, em direção às vitórias
Dias de luta e de glória de tantos outros anônimos
Nesse mundo imperfeito a gente dá o nosso jeito
De aliviar nossas dores e o aperto no peito
Acho que o grande defeito do ser humano em geral
É encarar todo estranho como se fosse um rival
Competição, medo e ódio é o que sustenta o sistema
O egoísmo é tão burro e a vaidade é extrema
A gente nem reconhece que entrou em estado de coma
E cada um no seu canto sofre dos mesmos sintomas
A ansiedade e os impulsos de auto-destruição
A vulnerabilidade, os problemas de aceitação
A rejeição amorosa, a frustração no trabalho
A traição de um amigo, coisas que dóem pra caralho
As despedidas e a saudade de quem já foi embora
Me dão ainda mais certeza da importância do agora
E da beleza da troca, do entendimento e do amor
E de enxergar o sentimento do outro seja quem for
Por isso eu tento
Conectar o meu pensamento
Com o pensamento de alguém que aparece a
Qualquer momento e me oferece um sorriso
Quem sabe um choro ou um grito
Um desabafo, um lamento ou um olhar meio aflito
Uma piada, um abraço, talvez um verso bonito
Ou um pedido tão simples como o que me fez o Vítor
Um improviso, uma batida, uma voz
A poesia que embala e fala de todos nós
Fica difícil explicar mas é tão fácil entender
Que a letra que fala dele fala de mim e de você
Das alegrias e dores que não são tão diferentes
Daquelas que os cantadores cantavam lá no sertão
Olhando a lua nascendo pintando a serra de prata
Pra pratear a solidão como cantou Gonzagão
Chuva de Prata é Gal Costa, Cazuza é O tempo não pára
Metamorfose Ambulante é Renato Russo e Chorão
Sou Rita Lee, sou mutante, nasci no planeta fome
Meu nome é Elza Soares e não aceito ouvir não
Sou Cássia Eller criança e, sim, conheço a verdade
Que os contadores de histórias contavam já nos cordéis
Stephen Hawking sorrindo também pegou a visão
Observando Saturno e o gelo dos seus anéis
Em sua cadeira de rodas mandou o papo certeiro, parceiro, “olhe pras
Estrelas, e não pros seus pés”
E foi virando essa chave que eu percebi que a nossa mente
É uma nave e que nos leva longe em vários rolés
Boa sorte
Firme e forte
Boa sorte
Boa sorte
Firme e forte
Vai com a força da mente
Força da mente